ESTIMA-SE QUE, TODOS OS ANOS, OS OCEANOS SEJAM POLUÍDOS COM CERCA DE 4,8 MILHOES A 12,7 MILHÕES DE TONELADAS DE PLÁSTICOS.

Tête-à-tête com Pedro Serra

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E no terceiro tête-à-tête, falo com o Pedro, é a primeira pessoa nesta rubrica que entrevisto mas não conheço pessoalmente. Aliás, a primeira vez que ouvi falar do Pedro, foi através de um familiar seu a contar uma história dele sobre shots! Depois fiquei a conhecer as suas séries e documentários sobre sustentabilidade social e ambiental através de partilhas das redes sociais e a partir daí comecei a seguir o seu trabalho. Define-se como slow traveller, vegan, minimalista e desperdício zero. Como podem imaginar foi difícil de decidir que temas abordar pois havia tanto para perguntar. Fiquem a conhecer o Pedro e leiam até ao fim para saber as suas sugestões (spoiler: nunca ninguém tinha feito tantas)! 

Fala-nos um bocadinho sobre ti, para os nossos leitores te conhecerem.

Então, eu cresci numa pequena vila do interior de Portugal – Proença-a-Nova, onde vivi até aos 18 anos. Estudei cinema em Lisboa e comecei a trabalhar em produção de TV. Um bocadinho farto de estar na roda do hamster, trabalhar em coisas que não me acrescentavam valor para pagar despesas, decidi despedir-me e começar a viajar. Depois de alguns projectos de voluntariado internacional, comecei em 2014 a trabalhar como filmmaker freelancer e em 2015 lancei a minha primeira longa metragem documental – “Que Estranha Forma de Vida”. É um filme em que abordo comunidades autossuficientes em Portugal e Espanha e em 2018 estreei a segunda longa metragem “Wasted Waste”. Este documentário é sobre freeganismo e estilos de vida alternativos aos padrões sociais comuns, em que questiono o sistema de consumo, capitalismo e por aí fora. Ambos os documentários abordam temas que giram em torno da sustentabilidade social e ambiental, tentando sempre mostrar formas de vida mais consentâneas com o ritmo do nosso planeta. 
Ano passado estreei a série documental “É P’ra Amanhã” na SIC, série em que eu e mais 5 pessoas percorremos Portugal Continental de lés a lés (da forma mais sustentável possível) em busca de documentar os projetos que estão a responder aos problemas da crise climática em que vivemos.

Quais os valores que te movem?

Os valores que me movem estão muito presentes nos documentários que faço. Os meus projectos são um bocadinho a minha necessidade de expressar positivamente os caminhos alternativos possíveis que já existem, para aquilo que eu penso que tem de mudar. Sou vegan há quase 9 anos pelos animais e por razões ambientais. Esta foi a minha primeira grande mudança ao nível do estilo de vida. Tenho muita atenção nos alimentos que consumo, desde a sua origem, como foram produzidos, se o seu valor é justo para quem os produziu, se infligiram sofrimento e toda a sua pegada até chegarem a mim. Não tenho carro, tento deslocar-me maioritariamente de transportes públicos ou de bicicleta e sempre que possível, evito voar. Acredito que a nossa economia tem de ser muito mais circular. Sou um minimalista por natureza. Estou a tentar ser o mais próximo do desperdício zero quanto possível. Não compro roupa nova há uns 5 anos. Toda a minha roupa é trocada ou em segunda mão. E considero-me activamente feminista. Penso que todas estas ideias estão interligadas. Não pode haver uma revolução num “sector” que não afecte o outro. Sou pela liberdade de todos os seres e pelo respeito mútuo. Sou pelo espírito comunitário, da cooperação ao invés da competição. 

Qual é para ti o papel de séries/documentários para a consciencialização das pessoas?

Eu acho que são uma ferramenta óptima para irmos beber informação. Muito do que sou hoje devo-o a filmes que vi, livros que li, conversas que tive. E são também uma forma de chegar às pessoas duma forma mais efectiva. Vivemos numa sociedade que nos bombardeia com informação e estímulos a toda a hora e antes de produzir qualquer conteúdo, penso e pondero muito, mesmo muito, se o que estou a produzir vale a pena. Se acrescenta algo positivo. E só quando tenho a certeza, avanço. Não quero fazer só para estar sempre a fazer algo. 

Deve ser difícil escolher só uma mas qual foi a maior aprendizagem que tiveste quando fizeste as gravações das séries/documentários?

Talvez aquilo que retire mais para a minha vida seja o poder regenerativoEu sou um optimista e acredito mesmo na mudança, mas muitas vezes penso que, mesmo que a população mundial mudasse de hábitos de consumo dum dia para o outro, o planeta iria demorar imenso a regenerar. E nunca chegaria aos níveis pré-humanidade. Então cheguei a esta conclusão ao observar todos os projectos que já abordei até hoje nos meus documentários. Aquilo que é o nosso poder e dever, é trabalhar em simbiose com a natureza e com um pensamento regenerativo. Ser sustentável é importante. Mas isso leva-nos a um ponto neutro. Não fazemos mal, mas não acrescentamos valor. Na natureza, tudo gera valor. Uma árvore só por existir, é habitat para animais, retira nutrientes à terra mas dá frutos, etc. O humano retira apenas. Precisamos de ter esta visão mais regenerativa, de oferecer à natureza mais do que o que retiramos dela. Isto foi uma mudança enorme de paradigma para mim. 

Achas que ainda se fala pouco de sustentabilidade em Portugal?

Eu acho que desde há 4 ou 5 anos para cá, houve uma mudança enorme nesse âmbito. Há uma década qualquer partido que metesse como prioridade assuntos de natureza ambiental seria ridicularizado. Nas últimas legislativas tivemos vários partidos a ter os temas ambientais nos primeiros tópicos dos seus programas. E isso deve-se ao interesse dos cidadãos nesse aspecto. Toda a gente já percebeu que não é algo abstracto que pode acontecer daqui a uns anos. Não, o colapso está a acontecer. E temos de passar ao próximo nível. Com a pandemia, o assunto voltou a ficar para trás, infelizmente. Mas isso foi em todo o mundo e não só em Portugal.  

Quais os planos para o futuro? Podemos esperar mais excelentes projetos como nos tens habituado?

Tenho dois documentários que quero filmar este ano, por isso espero ter novidades para sair no final deste ano, ou início do próximo!

Falando agora de um tópico um pouco diferente, sei que gostas de viajar, especialmente slow travelling, qual foi uma das experiências que mais te marcou?

Há muitas, claro. Mas já que falas em slow travelling, quando estava no Laos e queria ir para o Myanmar sem voar (porque já me sentia mal o suficiente por ter feito um voo intercontinental) percebi que apesar de haver fronteira física entre estes dois países, não existia fronteira diplomática. Então teria de atravessar o norte da Tailândia, onde já tinha estado e não tinha gostado particularmente pelo turismo massivo, e daí poderia entrar numa das 3 fronteiras do Myanmar. Fiz 36 horas em autocarros (poderia ter sido 45 minutos de avião). Mas valeu tudo a pena pelas pessoas que conheci nos entretantos e pelas realidades que presenciei. Além disso, quando cheguei a Chiang Mai na Tailândia era o primeiro dia de Songkran (novo ano Tailandês) que é uma festa incrível e diverti-me como não me divertia há muito.  

Qual um desejo teu para o futuro?

Conseguir ter uma ocupação full-time, que eu saiba que acrescenta valor real à Terra. O tal poder regenerativo que falava. Ainda estou nessa busca. 

Sugestões do Pedro

Livro: “How Fascism Works” de Jansey Stanley

Doughnut economics

Livro: “Donut Economics” de Kate Raworth

Livro: “Mask Off” de JJ Bola

Documentário: “Dominion”

Documentário: “Living on one dollar”

Documentário: “Human”

Documentário: “Cowspiracy”

Documentário: “The True Cost”

Documentário: “Woman”

Documentário: “Seed: The Untold Story”

Documentário: “13ª amenda”

Documentário: “The Mask You Live in”

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