Uma caderneta sustentável? O que é isso? Vamos ter cromos físicos? Não, descansem. Trata-se da nova rúbrica do Reciclar Não Chega!
Assim, numa altura em que estamos em confinamento, pretendemos alertar-te para a necessidade de, também neste período, não te esqueceres de que é necessário atuar. Neste sentido, convidámos alguns influenciadores e marcas a dar o testemunho, mostrando-nos que a mudança não é assim tão difícil.
Seja através da redução do nosso consumo, da alimentação, do apoio à economia circular ou, simplesmente, mostrando à nossa rede o que tem vindo a acontecer naquele que é o NOSSO Planeta.
O autocolante de hoje destaca a Mind The Trash, a primeira loja de desperdício zero em Portugal.
Caderneta Sustentável I Especial Confinamento (8)

1. Como surgiu a ideia de criar a Mind The Trash, uma loja online completamente zero waste?
Para vos contar como surgiu a ideia de criar uma loja online zero waste, tenho de vos falar um pouco sobre a minha história pessoal.
Nunca fui consumista e desde que me lembro que questiono o porquê das coisas. Um desses porquês, surgiu ao deparar-me com um mundo de descartáveis sempre que ia ao supermercado com a minha mãe.
- Porque estamos sempre a usar sacos de plástico novos se temos tantos em casa?
- Como é feito um saco de plástico?
- O que lhe acontece depois de usado?
Estas e outras perguntas levaram-me a questionar a indústria consumista em que vivemos e cedo percebi que a nossa atitude estava a ter um impacto negativo no ambiente, na nossa saúde e na dos animais.
Em 2014, mudei-me para Londres, onde vivi por 2 anos e meio. Lá, apesar de ter encontrado uma realidade de consumo e de descartáveis pior que a portuguesa, encontrei inúmeras soluções para o meu dia-a-dia mais amigas do ambiente. Decidi assim começar a partilhar todas essas descobertas numa conta de instagram a que dei o nome de “Mind The Trash”, inspirada na frase tão conhecida “Mind The Gap between the train and the platform!.”.
Londres, para além deste mundo paralelo mais amigo do ambiente, apresentou-me também o meu atual parceiro de negócio e ex namorado – Christian Andersen. Juntos decidimos lançar a Mind The Trash enquanto loja online em Portugal pois, ao mudarmo-nos juntos para cá, não conseguiamos encontrar os produtos que já estavamos a usar no nosso dia-a-dia.
Surguiu assim a Mind The Trash enquanto loja online Desperdício Zero.

2. Como foi a adesão dos portugueses a produtos zero waste?
Quando lançámos o projeto foi com o intuito de dar a conhecer produtos mais amigos do ambiente e achámos que iriamos ter este negócio como algo paralelo às nossas profissões. Contudo, a adesão foi tão boa que hoje em dia dedicamo-nos a tempo inteiro ao Mind The Trash. Um projeto do qual temos muito orgulho e que temos o maior gosto de trabalhar.
Curiosamente, ainda temos o registo dos nossos primeiros clientes, a quem enviámos um miminho o ano passado pois continuam a ser nossos clientes, depois de quase 4 anos abertos.
Ainda existe muito para dismistificar e sem dúvida que é muito importante continuar a educar o consumidor pois um dos fatores que faz ainda afastar alguns clientes é o preço de venda.
3. Os champôs sólidos Mind the Trash são um dos vossos produtos mais populares. Como surgiu a ideia de criarem o vosso próprio champô e qual foi o maior desafio?
Mudar de champô liquido embalado em plástico para um champô sólido foi um grande desafio.
Esta tentativa de mudança começou logo em Londres, onde experimentei inúmeras marcas e a maioria deixavam-me o cabelo muito pesado, sem brilho, oleoso e difícil de pentear. Uma grande frustração. Algumas marcas de champô sólido também embalavam o champô em plástico, o que não me fazia qualquer sentido.
Quando a empresa começou a gerar lucro, decidi que queria começar a desenvolver champôs sólidos que realmente resultassem no meu cabelo e que cativassem os mais céticos.
Assim, felizmente as pessoas certas apareceram à nossa porta e juntos começámos a desenvolver receitas de champôs. Durante cerca de 1 ano tive a experimentar inúmeras receitas, muitas falhadas claro! Hoje, posso afirmar que o tempo de espera bem que valeu a pena pois quando lançámos foram um grande sucesso!
Ainda hoje o são e saem em praticamente todas as encomendas.
O maior desafio foi o de acertar com as fórmulas. Houve uma altura em que tive cerca de 10 champôs sólidos na minha banheira:
- Uns acabavam por ficar uma papa com o uso (demasiado moles);
- Outros apresentavam um desgaste rápido;
- Outros deixavam o cabelo demasiado pesado
Felizmente conseguimos acertar com fórmulas das quais estamos super satisfeitos. Eu já não quero outros!
4. Como funciona a gestão de organizar, armazenar e enviar encomendas sem produzir lixo?
Infelizmente o não produzir lixo é um mito. Por muito que não queiramos, temos na nossa posse materiais que não conseguimos aproveitar.
Sem dúvida que criamos muito pouco lixo mas inevitavelmente temos e geramos. É preciso estarmos constantemente atentos à forma como os fornecedores nos enviam as encomendas.
Na Mind The Trash tentamos reutilizar tudo o que nos chega dos fornecedores. Caixas e papel de acondicionamento são reutilizadas para expedir encomendas tanto através do nosso canal de distribuição, tanto através do nosso site para consumidor final.
Para além deste material, temos inúmeros clientes que são incríveis e que nos entregam caixas de outras encomendas que fizeram, revistas, jornais, papeis de rascunho, entre outros. Estes, aproveitamos também para expedir as encomendas.
No nosso escritório e armazém não existe fita cola de plástico. Existe somente, e desde o início da empresa, fita cola de papel que pode ser reciclada ou compostada com as caixas.
No armazém, tudo é arrumado e organizado com caixas aproveitadas e mesmo no escritório muito do material que temos é aproveitado dos nossos tempo de faculdade.
Recentemente lançámos um novo serviço em parceria com a DPD em que os nossos clientes podem contactar-nos para enviar as embalagens de volta para nós, a custo zero para eles. Para que seja sustentável apenas permitimos que as enviem se enviarem mais caixas, de forma a compensar a pegada de carbono e o que nos é cobrado pelo serviço. Desta forma, pretendemos continuar a reutilizar aquilo que foi expedido.
5. No que toca ao mercado internacional, a Mind The Trash já exporta para fora de Portugal? Existe algum plano de expansão? Talvez uma loja fisíca?
Já exportamos para fora de Portugal mas não é o nosso foco.
Muitas são as pessoas que nos perguntam por loja física. Admito que adorava ter uma ou várias lojas Mind The Trash mas não está nos nossos planos de expansão para já. As vendas online têm corrido muito bem e preferimos estabilizar no online e posteriormente analisar essa possibilidade.
6. Se só pudessem recomendar dois produtos da vossa loja a alguém que está a começar o seu percurso para uma vida mais sustentável, quais recomendariam e porquê?
Admito que me veio logo à cabeça mencionar uma garrafa reutilizável, mas a verdade é que muito provavelmente essa pessoa já terá algo em casa que pode reutilizar para transportar água. Caso não tenha, então esta será a minha primeira recomendação que é muito fácil de aplicar no dia-a-dia.

São vários os motivos para que esta seja a minha primeira recomendação. Por exemplo, cerca de 80% das garrafas de plástico acabam por ir parar aos aterros e apenas uma pequena percentagem é reciclada. Isto quando não vai parar à natureza, onde demoram cerca de 450 anos a serem degradadas.

O segundo produto a recomendar seria o sabonete da loiça Mind The Trash. Todos lavamos algo à mão e maioritariamente consumimos detergentes com ingredientes tóxicos e embalados em plástico. O nosso sabonete funciona muito bem, é produzido em Portugal, é formulado com ingredientes orgânicos e vem numa embalagem compostável ou reciclável.
Num artigo da National Geographic, é referido que para produzir água engarrafada é necessário quase 2,000 vezes mais energia do que para produzir água da torneira. Só aqui podemos ver o quão simples mudanças fazem toda a diferença.
7. Quando vamos começar a ver mais produtos zero waste nas lojas tradicionais e grandes cadeias de supermercados?
Essa é uma pergunta interessante.
Sinceramente, por experiência própria, prefiro trabalhar com o pequeno comércio local que tem os mesmos valores que nós. Não me interessa trabalhar com uma loja que não se preocupa com a sustentabilidade e entrega os nossos produtos embalados em plástico.
Tem de haver uma mudança e essa mudança começa connosco, consumidores. O nosso voto faz a diferença e a verdade é que os grandes só mudam, quando os consumidores exigem outras respostas. As grandes cadeias também complicam em demasia o sistema de entrega para os distribuidores e prazos de pagamento demasiado longos o que não me parece justo.
Assim, pessoalmente acredito que as grandes cadeias irão começar a ter alternativas criadas pelas grandes marcas e com quem já trabalham, apenas para colmatar uma falha de oferta que têm para não perder clientes. O problema, é que desta forma não passa mesmo de uma moda sendo que nós, iremos continuar na luta por acreditarmos que este é o caminho e iremos continuar a tentar ser cada vez melhores na redução do desperdício.
8. Shampoos sólidos, pensos menstruais, discos desmaquilhantes... para quando um novo produto Mind the Trash?
Está para muito breve! Nem imaginam a quantidade de produtos que já estamos a desenvolver para lançar!
Este é um dos desafios da nossa empresa que me dá muito gozo pois tentamos sempre desenvolver algo diferente do que já existe e à nossa imagem. É um processo demorado mas que vale a pena percorrer.

Gostaste da entrevista à Mind The Trash? Então estes artigos podem ser interessantes para ti:
- Tiago Matos / Autor da página Green Tribe
- EcoX / Marca portuguesa que produz detergentes a partir de óleos alimentares
- Cláudia Oliveira / Autora da página The Vegan Cashier
- Shaeco / Marca portuguesa que produz champôs sólidos
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- Zouri Shoes /Marca portuguesa que produz calçado com plástico retirado dos oceanos
- Joana Guerra Tadeu / Ambientalista Imperfeita